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3 de nov. de 2011

Reflexões sobre a divisão sexual do trabalho na militância cotidiana

*Por Luka Franca

Faz uns 4 anos que acompanho mais de perto o debate feminista junto aos movimentos sociais, comecei a acompanhar pela ENECOS o que chamávamos de GET de Combate às Opressões, foi pela ENECOS que comecei a acompanhar o movimento feminista e a construção do 8 de março de São Paulo. Foi pro lá também que comecei a perceber o quanto algumas tarefas militantes eram realizadas de forma mais frequente por homens do que mulheres e vice-versa.


Há 3 anos me organizei em uma corrente política, para quem ainda não se deu conta eu sou filiada ao PSOL e organizada numa corrente chamada Coletivo Socialismo e Liberdade, e dentro destes dois espaços de militância também me deparei com a mesma realidade encontrada no movimento estudantil, algo que normalmente é chamado de divisão sexual da militância, respaldado muitas vezes na própria realidade da divisão sexual do trabalho onde mulheres cuidam do trabalho reprodutivo e os homens do trabalho produtivo, mulheres passam mais tempo nos espaços privados da sociedade e os homens nos espaços públicos.

A Divisão Sexual do Trabalho existente na sociedade é reverberada também nas organizações políticas em geral, acabamos por encontrar a existência de poucas políticas afirmativas e de formação para as mulheres poderem se apropriar dos espaços de direção e formulação da política, muitas vezes sendo relegadas as tarefas de organizar espaços para as reuniões, se responsabilizarem por garantir a alimentação, creches e o máximo apitar sobre a política relacionada às mulheres. Mui raro é vermos uma real transversalidade entre a discussão política-econômica e a discussão política-feminista. Criando assim a tal da Divisão Sexual da Militância. (FRANCA, Luka. Reflexões sobre o lugar da mãe na política)

Falo isso pois há algum tempo me pergunto se realmente as organizações políticas (sejam partidos, entidades estudantis ou sindicais, movimentos populares) em sua maioria tem realmente uma política de combater a tal da divisão sexual da militância, seja em seus fóruns mistos quando normalmente quem acaba tomando conta das necessidades de cuidados e parte da organização logística para garantir a realização dos espaços são as mulheres, enquanto normalmente a maioria das pessoas que tem a tarefa de formulação política e negociação das pautas e acordos são os homens.

Essa questão é algo importante de se frisar quando vamos debater mulher e poder, pois realmente garantir a participação de mulheres nos espaços de decisão política não é apenas assegurar formalmente o espaço dela nas direções, delegações afins, é também ter política cotidiana para que possa exercer cotidianamente o seu protagonismo político, ou é razoável dar lugar na política para as mulheres e não assegurar que para poder estar nos espaços de decisão é necessário que se tenham creches, no caso das mães, acesso para mulheres deficientes (rampas, intérpretes…). Além de assegurar estes espaços é preciso que haja sim uma troca de papéis organizada politicamente, pois mesmo quando há espaço de creche e até mesmo quem cuida da logística de alimentação nos espaços são as mulheres, corroborando com a divisão sexual do trabalho.

Quando vamos para os espaços auto-organizados acabamos também nos deparando com isso, encontro de mulheres, plenária de mulheres são espaços para que todas as mulheres militantes estejam presentes participando das discussões, formulação política e outras coisas, como fazer isso se muitas vezes até nesses espaços as mulheres também tem que cuidar da alimentação e da creche? Isso é razoável? Os homens também não devem ter compromisso com a construção destes espaços reconhecendo que quem formula e vota a política para as mulheres são as mulheres?

Nestes poucos anos de militância socialista e feminista organizada isto é algo que muito me incomoda, pois nos espaços mistos de militância os aparelhos que deveriam garantir a nossa participação política nos espaços só existem se nós mesmas estivermos lá dando conta disso, assim como nos espaços auto-organizados, que garantia de protagonismo político é essa que não combate a divisão sexual do trabalho dentro das próprias organizações, colocando para os homens de que ser cuidador na creche, ajudar na logística de alimentação, ficar numa banquinha para vender camisetas enquanto as mulheres fazem política não são tarefas menores, mas sim forma de combater concretamente o machismo em nossas organizações?

Não vislumbro fórmulas mágicas para resolver estes problemas, não será algo a mudar de uma hora pra outra, mas a disputa desta concepção é importante, pois não adianta garantir espaços para as mulheres formularem e decidirem a linha política de atuação neste debate se a garantia da participação política nos encontros auto-organizados também tem que ser garantidos pelas mulheres. Acho fundamental envolver os camaradas homens nestas construções, os colocando como responsáveis pelas tarefas que tradicionalmente são nossas, isso ajuda a formar um caldo político diferente, ajuda a pautar nas organizações a necessidade de transpassar a divisão sexual do trabalho até mesmo entre nós.

Infelizmente, ao que parece muita vezes é preferível apenas pautar as questões mais formais do feminismo, do que realmente refletir como iremos realmente garantir a participação das mulheres nos espaços mistos e auto-organizados e realmente acabar com a divisão sexual da militância e do trabalho.



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