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23 de jun. de 2011

“O Estado é laico. E é por ele que os congressistas devem lutar”, diz Jean Wyllys (PSOL)



Jean Wyllys estreia hoje como novo colunista da Carta Capital.  As colunas serão publicadas quinzenalmente, às terças.
Eis a entrevista de apresentação, concedida ao jornalista Fernando Vives:

“O Estado é laico. E é por ele que os congressistas devem lutar”, diz Jean Wyllys
A sua simples presença no Congresso Nacional já foi suficiente para causar urticária nos religiosos fundamentalistas mais exaltados. Um homossexual assumido e defensor dos direitos humanos (e, sobretudo, dos direitos LGBT´s – Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros), vinculado a movimentos sociais e que se expressa confortavelmente sobre temas polêmicos tem corado de ódio deputados como Pastor Marco Feliciano (PSC-SP) e Anthony Garotinho (PR-RJ), evangélicos neopentecostais que intrepretam a Bíblia ao pé da letra, além do já hour councours Jair Bolsonaro (PP-RJ).
Jean Wyllys de Matos Santos, jornalista mestre em Letras e Linguística pela UFBA, foi eleito deputado federal pelo PSOL-RJ na última eleição após ficar famoso no País ao provar que existe vida inteligente até em um programa como Big Brother Brasil. E tem se firmado como um dos congressistas mais atuantes da atual legislatura.
Jean Wyllys é o novo colunista quinzenal do site de CartaCapital. Neste rápido bate-papo, ele mostra quais serão seus temas preferidos e ainda fala sobre o incômodo que sua presença causa nos mais reacionários do Legislativo brasileiro, do preconceito que sofre na casa e das tentativas de diálogo que mantém com eles.
CartaCapital: Você é deputado em uma época de fortes reações sobre o movimento LGBT, tanto a favor quanto contra. Houve uma evolução nos últimos anos quanto a este tema?
Jean Wyllys: Minha presença no Congresso acirrou os ânimos e o debate. Não quero parecer cabotino falando isso, mas sou de um movimento social e sei a diferença de como a presença de alguém como eu incomoda. É a primeira vez que um homosseuxal assumido levanta esta bandeira no Congresso – Clodovil também o era, mas não defendia a bandeira. E ainda entrei em uma comissão tradicionalmente masculina e heterossexual que é a de Finanças e Tributação, com vários parlamentares conservadores.
CartaCapital: Você acha que sua presença nessa comissão incomodou?
Jean Wyllys: Sim, é um homossexual lado a lado com deputados em grande parte conservadores. Foi uma estranheza enorme. O tratamento que dou ao movimento LGBT, inserindo-o no tratamento dos direitos humanos, surpreendeu os deputados que, imagino, esperavam uma certa futilidade minha como deputado. Por isso que penso que só a minha presença na Câmara já é um ganho para o movimento como um todo. Estamos evoluindo com nossas questões na sociedade. A homossexualidade é associada a marginalidade, é um preconceito estereotipado. Mas não sou um estereótipo, sou um gay difícil de ser ridicularizado.
CartaCapital: Como avalia o Brasil em relação a outros países quanto a questão do respeito aos homossexuais?Jean Wyllys: Não gosto muito de comparar países, uma vez que a experiência da democracia é diferente em cada um, com tempos diferentes, mas diria que estamos atrás da Argentina, por exemplo. Por aqui ainda se mata muito homossexual por conta de sua orientação e do modo de vida. A Argentina avançou nessa pauta dos direitos humanos, na abertura dos arquivos de sua Ditadura Militar e da homofobia. E lembremos que é menos rica e desenvolvida que o Brasil economicamente. É tudo interligado: a questão dos homosexuais, a racial, a dos povos migantes, contra as mulheres e outras têm todas a ver com o respeito aos direitos humanos.
CartaCapital: O governo Dilma Roussef recentemente vetou o kit-homofobia que iria para as escolas de todo o País, numa tentativa de conscientização sobre o tema. Como avalia o veto?Jean Wyllys: É estranho que o Brasil subscreva os tratados internacionais sobre LGBT´s e, ao mesmo tempo, faça isso. O kit anti-homofobia foi considerado sem qualidade pela presidenta. Era um projeto que já tinha o aval do MEC e tinha pareceres favoráveis como o da Unesco. Então estava aprovado e chancelado. Acontece que era um governo fragilizado com a presença do caso Palocci e que não podia admitir que sofreu pressão da bancada evangélica para abafar o caso em troca do veto do kit. Foi pura moeda de troca.
CartaCapital: O senhor já tentou diálogo com os congressistas conservadores. Eles deram margem para isso?Jean Wyllys: A gente só avança se dialogar. Precisamos discutir um mundo comum. Eu e a deputada Manuela D´Ávila (PC do B-RS) tentamos dialogar. Veja, tem muita gente que não é evangélica, não religiosa e que odeia homossexuais. Também existem os evangélicos que lidam bem com os homossexuais. Então é injusto associá-los aos evangélicos totalmente aos fundamentalistas. Há congressistas conservadores abertos ao diálogo como Lincoln Portela (PR-MG), Roberto de Lucena (PV-SP) e Ricardo Quirino (PRB-DF), entre outros. Fizemos uma primeira reunião difícil. Podem não gostar, mas não podem ignorar esses conceitos.
CartaCapital: Por que foi uma reunião difícil?Jean Wyllys: Foi uma primeira reunião difícil porque fomos para ter uma conversa do século 21 e fui recebido com trechos da Bíblia. Não se pode selecionar um trecho específico, com uma leitura fundamentalista. Mas abrimos o diálogo, que é o que mais importa. Queremos que todas as religiões se manifestem, mas sempre lembrando que devem se pautar pela questão da igualdade, que está na Constituição. O Estado é laico. Quando todos os congressitas tomaram posse, juraram legislar nestas condições.
CartaCapital: O fato de ser um ex-Big Brother atrapalha sua vida de congressista?Jean Wyllys: Nada, influencia zero. É como se eu não tivesse feito. A única reação é de pessoas que visitam o Congresso, mas nos trabalhos da Casa não há influência não.

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