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16 de dez. de 2011

Meia-entrada por inteiro - Por Raphael Sodré

Raphael Sodré*

A votação do Estatuto da Juventude vem ganhando nos últimos dias contornos de novela. De um lado a juventude brasileira, ávida por ampliação de direitos. Do outro os grandes produtores culturais, receosos de verem reduzidos seus lucros. No meio de tudo isso, o debate sobre o financiamento das entidades estudantis.


Em tramitação no Senado, o projeto de lei veio aprovado da câmara com um sentido geral de reconhecimento do jovem como sujeito de direitos, bem como das especificidades juvenis. No entanto, chegou carregado de polêmicas: meio-passe interestadual, percentual do Fundo Nacional de Cultura para jovens e a mais sentida, a meia-entrada para estudantes. Neste ponto cabe um registro: o relatório final aprovado da deputada Manuela D’ávila (PCdoB-RS) ignora os 17 milhões de jovens que não estão nas escolas ou universidades e garante apenas a estudantes o benefício, não entendendo a juventude como uma etapa de formação de valores e de vulnerabilidade financeira.

Indo para a Comissão de Constituição e Justiça do Senado, o projeto recebeu a relatoria de Randolfe Rodrigues (PSOL-AP), que ainda não concluiu os trabalhos. O projeto deveria ter sido votado no dia 07 de dezembro, mas a inexistência de acordo para aprovação resultou em atraso. A juventude ganhou com isso uma oportunidade de ouro: poderá encaminhar as resoluções da 2ª Conferência Nacional de Juventude, que acontecerá entre os dias 09 e 11 de dezembro, para subsidiar o relatório.

Entretanto, um dos empecilhos para o projeto ser aprovado com as conquistas ratificadas na câmara ou até mesmo ampliando-as é a posição da direção majoritária da UNE. Na defesa corporativa dos interesses financeiros da entidade, um acordo de bastidores está sendo operado com os produtores culturais: restringir-se-ia a quantidade de meia-entradas a uma quota de 40% do total de ingressos em troca do monopólio da emissão das carteiras estudantis. Isso significa garantir à Une/Ubes uma fonte de financiamento gigantesca, nem um pouco transparente e bastante antidemocrática, já que obriga o estudante a pagar por um direito. Por outro lado, limita o direito: só uma parcela dos jovens teria meia-entrada, aqueles que primeiro comprarem o ingresso e que tiverem a carteira das entidades nacionais. Para exemplificar, um grêmio estudantil em uma cidade do interior do país sem contato com o movimento estudantil nacional (o que, diga-se de passagem, é uma regra) não poderia ter reconhecido o direito a meia-entrada daqueles que representa? Fica ainda outro questionamento: quem fiscalizaria o cumprimento das quotas? Haveria fiscais em cada sala de cinema, porta de teatro, entrada de apresentações? No afã do lucro fácil quantos locais não atingiriam a quota estabelecida?

É fato que não podemos permanecer na atual situação de inexistência (teórica ou prática) de meia-entrada em muitos locais do país, mas a maneira de enfrentá-la não é restringindo o direito, e sim o ampliando. O caminho deve ser a extensão do benefício a toda a juventude. Também o Estado brasileiro deve pagar sua parte da fatura com subsídio aos pequenos produtores culturais, impedindo que sofram prejuízo com a medida. Caso o projeto seja aprovado como veio da câmara, daremos também um passo importante, ainda que incompleto. O que não aceitaremos, em hipótese alguma, é recuo ou diminuição de direitos.

*Raphael Sodré é estudante de Direito da Universidade Federal do Espírito Santo, militante da juventude do PSOL, do campo Contraponto e 1º Diretor de Políticas Educacionais da UNE eleito pela oposição de esquerda.
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