Diante
da pressão popular por melhoria do transporte público, o chamado Bus Rapid
Transit (BRT) foi a cartada da administração de José Ronaldo para dizer que a
resolução do problema estava a caminho. Do anúncio ao contrato com a Caixa
Econômica Federal, que endivida o município por décadas a fio, o processo todo
foi muito noticiado, mas em nada problematizado. Agora que o empresariado mais
uma vez mostra as garras ao propor aumento de tarifa para R$ 2,94 e chegamos a
março, prazo anunciado para entrega do projeto executivo do BRT pela
consultoria contratada pela prefeitura, talvez seja oportuna uma reflexão mais
profunda. Em especial porque a situação do transporte coletivo em Feira de
Santana continua marcada pelos velhos problemas que têm motivado manifestações
contra os atrasos, os ônibus velhos, a insuficiência de linhas, o desrespeito a
idosos e deficientes, o descaso com a zona rural, a total falta de estrutura de
pontos, entre as várias crueldades do dito Sistema Integrado de Transporte
(SIT). Portanto, antes de jogar confetes, devemos nos perguntar simplesmente se
o BRT resolverá de fato os problemas. Para quem se lembra da implantação do
próprio SIT, em 2005, o mesmo também foi apresentado como “a” solução para os
diversos problemas do transporte coletivo em Feira. Passado alguns anos, é
evidente que a realidade difere muito da propaganda oficial.
O
BRT é sempre vendido a partir da experiência curitibana, mas sem maior atenção
ao fato que esse sistema de via expressa e exclusiva para ônibus tem
funcionamento diferenciado a depender do município. Variam quais setores
sociais serão prioritariamente atendidos no seu “desenho” e, por consequência,
se estará voltado ou não às necessidades da maioria da população. Tendo em
vista isso, dois critérios importantes são a forma como tem sido conduzido e a
maneira como se relaciona ao conjunto dos problemas de mobilidade e crescimento
de Feira (Em Curitiba, por exemplo, as inovações no transporte coletivo foram
parte do Plano Diretor de 1966). Se a própria decisão sobre a opção do BRT nem
ao menos foi discutida no fictício Conselho Municipal de Transporte, os sinais
posteriores também são preocupantes. Ainda mais considerando se tratar de uma
intervenção urbana que custará aos cofres públicos mais de 90 milhões de reais
sem garantia qualquer que funcionará em prol da maioria da população, exceção
feita pela “garantia” dada pelo marketing da atual gestão municipal.
Em
síntese, três grandes problemas já se apresentam em relação à imposição do BRT.
O primeiro, evidente, diz respeito ao nível de consulta pública sobre a sua
implantação, já que, a julgar pelas manifestações ao longo dos últimos anos e
cotidianas denúncias da população, o transporte é assunto que interessa a mais
pessoas que o punhado frequentador do gabinete do prefeito. Até agora, a
consulta à população se situa abaixo de zero. Em segundo lugar, a própria
legalidade da questão deve ser considerada. Parece profundamente estranho a
Caixa liberar recursos, em um município com mais de 600 mil habitantes, sem que
houvesse cobrança dos instrumentos mais elementares de planejamento urbano e
mobilidade. A essa altura, não é segredo que Feira cresce ao arrepio do que é
previsto no Estatuto da Cidade (Lei 10.257 de 2001), não contando com um Plano
Diretor de Desenvolvimento Urbano que organize democraticamente a expansão
municipal. Mas, mais especificamente em relação ao transporte, interessa saber
que a mesma lei federal prevê a obrigatoriedade de plano de mobilidade para
cidades com mais de 500 mil habitantes (Art. 41, §2º). Não à toa, como terceiro
grande problema, a ausência desse planejamento de conjunto traz o risco de
daqui a poucos anos, assim como aconteceu com o SIT, tenhamos um novo sistema
ótimo para os empresários que o operam e profundamente inadequado para a
maioria que o utiliza. É fundamental que não compremos gato por lebre: o
problema do transporte coletivo não é a ausência de uma ou duas vias rápidas no
Centro, digamos as avenidas Getúlio Vargas e João Durval. O problema maior é a
mobilidade bairro a bairro e suas inúmeras deficiências, desde a precariedade
dos veículos à irracionalidade da ida aos terminais de integração para chegar a
um bairro vizinho. O BRT resolverá? Para respostas, com a palavra o senhor
prefeito.
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